domingo, 31 de março de 2024

" 35 "


a distância entre nós abafa.

sorri meigamente o céu noturno.

por entre meus olhos [ sonhadores

embatem-se os murmúrios do mar

e a luminosidade da lua [ moribunda…




a distância entre nós transluz.

lágrimas, gratuitas, me purificam.

é mentira que o tempo cura “todas” as feridas!




a distância entre nós alui.

adivinho em sua pele tênues sardas,

tristes, perdidas, solitárias…

caem-lhe as alças do vestido pelos ombros,

seus cabelos me cingem o peito,

e minh’alma sente a sua!

ah, perpassam sensações infindáveis e profundas,

ao fluir do esmaecer das estrelas 

com a proximidade da alvorada…




e leves acordes de sonatas,

e febris desejos extremados, 

( insurretas mágoas e/ou imaculados êxtases? )

flagram nossos trêmulos dedos, 

a tocaram-se,

timidamente,

sob a calma tépida alvura 

dos suaves lençóis…




pincelando rocios - 2011


quarta-feira, 27 de março de 2024

" 43 "


dúvidas, que ora me assaltam,

justapostas às ansiedades mais cruas,

despencadas no vórtice

dos silêncios abissais

                         [ incontidos na minh’alma…




jogastes pedras na silente água?

respostas não foram obtidas!

beijastes  tesos lábios?

masturbaram todos os sonhos 

                                            [ em que se goza! 

trilhastes desconhecidos caminhos?

as venturas prometidas não vêm mais!




mas, dúvidas, sois potestades…

umas coisas, miseravelmente reconhecidas como míticas,

que rivalizam com os deuses!

sois músicas tocadas somente nos acordes da memória…

plenitude açambarcada pelos olhos

que medram em um cenário inóspito

                                                        [ vazio!




( … ) nuvens, sem saída, desembestadas no céu,

        ainda refletem do sol a vermelhidão…

        dúvidas, que me assaltam,

        a lua e as estrelas, 

        nas incontáveis noites vindouras,

        não mais brilharão?




se todas as certezas vingassem - 2019


segunda-feira, 25 de março de 2024

" untitled 20 "

 

querida, te abraço à noite 

                     [ extraviada,

à santificada noite 

              [ que nada reprime,

à noite que exige corpos e almas

                           [ almas e corpos,

e não mascara a mais íntima das relações

                                [ humanas.




s-e-x-o!

( … na intimidade 

    da conjugalidade

    o amor faz-se império 

    e promove catarse 

              [ redimindo “nós”, 

                os amantes… )

e a noite 

    [ cálida 

      [ rola suas sombras,

esfuzia com a lua 

e com as estrelas,

redesenha pensamentos 

e emoções,

espera - impassível - clarividências,

joga na cara palavras, 

delírios 

e sonhos

  [ no justo limite 

    do nosso amor.




querida, a noite se adensa sobre nossos corpos e almas,

nossas respirações - entrecortadas - sobressaem-se ao mar,

às nuvens 

e ao tempo…

nossos chacras realizam metamorfoses…

nossa vigília consuma-se em êxtase

                            [ pleno!...




gozo!

trespassados pela noite, querida,

( … ops, quase digo teu nome… )

já flutuamos 

   [ sem amarras do destino,

livres, 

leves 

e soltos 

em incríveis idílios,

fascinados 

       [ um pelo outro,

regressando à um “locus” 

de que nunca - sequer - nossas almas partiram,

posto que uma só carne 

conforma nosso “corpus”!




locus&corpus - 1997


quinta-feira, 14 de março de 2024

" 73 "

 

o acaso é acontecimento imprevisto?

não!... é negligência competente,

meticulosa e intuitiva.

por vezes, faz-se prosa

                  [ eloqüente…

lê com assiduidade os obituários,

nunca perde um velório,

faz-se prosaico afeto

                [ que a alma sente…




segredo!... o acaso faz-se “de conta”, involuntário,

            mas tem Deus como regente.

pssssst!... o acaso é surdo, cego e mudo,

            mas nada esquece, tudo lembra,

            fia - sem brumas - sua própria história,

            rediviva emanação de Deus.




o acaso existe. persiste.

convence. veladamente, nos basta!

a vida, ah, se escorre a vida entre os dedos,

a morte, ah, fica a morte como única certeza…

… enquanto isso, Deus

                 [ subrepticiamente 

                   [ nos envolve!             




caçando anelos  - 2023


quinta-feira, 7 de março de 2024

" 66 "

 

minha profissão?... de lampiões, no Umbral, acendedor.

é, dentre todas as ilusões, 

que assoberbam o coração,

a que o diabo jamais perdoa,

pois à imortalidade da alma faz exaltação!




explico: voe-se o que cada anjo voa

         o que lhe “dá na telha” voar…

lá estarão os lampiões

              [ sempre acesos 

                       [ todos os caminhos a iluminar…




… regresse-se no tempo em que cada viajante regressa

  o tanto que sua saudade apertar…

lá estarão os lampiões

              [ sempre acesos

              [ todos os aconchegos 

                         [ e fascínios a iluminar…




… reze-se o que cada pecador reza

  fazendo juz à sua alma salvar…

lá estarão os lampiões

              [ sempre acesos, 

relutando a conceder ao diabo um único lúmen,

enquanto transformam cada alma em “id” 

                                  [ fabular! 




almas em profusão - 2023


domingo, 3 de março de 2024

" 21 "

 

louca, esta vida [ errante

precioso, este mistério [ não solucionado

místicas, estas mãos tão nodosas

grácil, esta aura que fulge…




e erra [ em voracidades e desditas

e iletra [ em ignorâncias e turvações do saber

e transfigura reverso pez [ em rústicas pérolas

e arde arco-íris [ em aljôfares mil…




ah, vá!... deixa que a Luz repouse,

se nos é facultado percebê-La,

em cada silente momento [ de paz…




ah, vá!... deixa que a Luz adentre,

se nos é facultado reverenciá-La,

em cada alma sem corpo [ fugaz…


  


naquele brilho - 1997

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

" digitália 19 "

 

só me realizava

enquanto ficção… coincidia voz neurótica

                              sincronia apoteótica

                              euforia exótica

                              recorrência temática

                              apoplexia…

e talvez já tivesse acreditado na felicidade

coexistindo fábulas 

e realidade

enquanto estrelas e galáxias se fundiam no céu!




só carregava

canga(s) no pescoço… ruminava embustes 

                                      e happy endings de alcovas

                                      depois da morte magnificada 

                                      em esfacelados mundos 

                                                                [ ao léu…

e talvez do mundo nada levasse

pois que destruía sonhos entre dentes

marchava contra hediondos inimigos

penetrados que já haviam

                              [ furtivos

                                [ na minha mente!




e talvez do mundo nada levasse… 

nada realizasse… 

nem mesmo ficção!




outono - 1996